terça-feira, 15 de maio de 2012

Povos Indígenas do Século XXI



O que o futuro reserva aos povos indígenas em todo o mundo e o que significa ser indígena no século 21?

A resposta a essa pergunta irá variar muito entre os 250 a 300 milhões de indígenas existentes em praticamente todas as regiões do mundo. Há enorme diversidade entre os cerca de 5 mil grupos distintos de indígenas, cada um dos quais com história, língua, cultura, sistema de governança e modo de vida singulares. Embora alguns povos indígenas continuem a subsistir da pesca, caça e coleta de alimentos.
Os grupos indígenas do mundo todo realmente enfrentam alguns desafios comuns na luta para proteger suas terras, seus recursos naturais e suas práticas culturais. A batalha para proteger os direitos humanos e os direitos à terra dos povos indígenas torna-se bem mais difícil por tão poucas pessoas conhecerem a fundo a história ou a vida contemporânea dos indígenas. E sem nenhum contexto histórico ou cultural, é quase impossível entender as questões indígenas atuais.
Problemas têm raízes no colonialismo.

Ao contemplar os desafios enfrentados pelos povos indígenas em todo o mundo, é importante lembrar que as raízes de muitos problemas sociais, econômicos e políticos podem ser encontrados nas políticas coloniais. Os povos indígenas do mundo todo estão ligados pela experiência comum de terem sido “descobertos” e submetidos à expansão colonial em seus territórios, o que causou a perda de um número incalculável de vidas e de milhões de hectares de terra e de recursos. Os direitos mais básicos dos povos indígenas foram desrespeitados, e eles foram submetidos a uma série de políticas elaboradas para integrá-los na sociedade e na cultura coloniais. Com demasiada freqüência o legado dessas políticas era pobreza, alta mortalidade infantil, desemprego generalizado e abuso de substâncias, com todos os problemas decorrentes.
Ao contemplar os desafios enfrentados pelos povos indígenas em todo o mundo, é importante lembrar que as raízes de muitos problemas sociais, econômicos e políticos podem ser encontrados nas políticas coloniais. Os povos indígenas do mundo todo estão ligados pela experiência comum de terem sido “descobertos” e submetidos à expansão colonial em seus territórios, o que causou a perda de um número incalculável de vidas e de milhões de hectares de terra e de recursos. Os direitos mais básicos dos povos indígenas foram desrespeitados, e eles foram submetidos a uma série de políticas elaboradas para integrá-los na sociedade e na cultura coloniais. Com demasiada freqüência o legado dessas políticas era pobreza, alta mortalidade infantil, desemprego generalizado e abuso de substâncias, com todos os problemas decorrentes.
Como resultado do trabalho de muitos povos indígenas e grupos defensores de causas específicas, a Assembléia Geral das Nações Unidas colocou em votação a Declaração de Direitos dos Povos Indígenas em 13 de setembro de 2007. Embora a grande maioria tenha votado a favor da declaração, os Estados Unidos, a Nova Zelândia, o Canadá e a Austrália votaram contra. Mas a atitude desses quatro países está mudando. Kevin Rudd, primeiro-ministro da Austrália, anunciou recentemente que seu país apoiará a declaração, um passo importante para os aborígenes desse país, bem como para os povos indígenas do mundo todo. Com a eleição do presidente Barack Obama em 2008, muitos esperam que os Estados Unidos reconsiderem seu voto contra a resolução.
A Declaração da ONU protege os direitos à autodeterminação e direitos concedidos por tratados aos povos indígenas, bem como o direito de “buscar livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural”. À medida que lutam por esses direitos, o acesso à terra ancestral e o seu controle são essenciais à iniciativa de autodeterminação dos povos indígenas desde as tribos de Manipur, na Índia, até o povo andino no Peru, Equador e Bolívia.
Ao mesmo tempo em que os povos indígenas retomam o controle de suas terras e de seus recursos, trabalham para desenvolver suas economias e reconstruir suas comunidades e nações. Embora haja muitos empreendedores indígenas individuais, há também um número extraordinário de empresas que comumente pertencem a governos ou comunidades tribais. Essas empresas vão desde cooperativas de tecelagem de mulheres nas margens do Rio Negro no Brasil ao comércio de pescados do povo luo no Quênia. Feiras anuais para produtos e empresas indígenas são realizadas em Winnipeg, Canadá e em Melbourne, Austrália. Nos Estados Unidos, muitos programas sociais e culturais são financiados com receita de empresas de tribos, tais como editoras de livros, shopping centers e cassinos.
Conforme desenvolvem a economia e lidam com questões sociais, os indígenas valorizam a preservação da cultura, da língua, das artes da cura, canções e cerimônias tribais. É milagroso que, em face da enorme adversidade, muitos indígenas tenham conservado o conhecimento tradicional, valores fundamentais que os mantiveram ao longo do tempo, e um senso de coesão como povo tribal.

Questões comuns

Apesar de suas inúmeras diferenças, os povos indígenas do mundo todo compartilham alguns valores comuns, inclusive o senso de reciprocidade, às vezes fragmentado, mas ainda muito presente, e uma clara compreensão de que suas vidas são parte inseparável da terra. Essa profunda sensação de interdependência mútua e com todos os outros seres viventes alimenta o dever e a responsabilidade de conservar e proteger o mundo natural, que é um provedor sagrado de alimentos, medicamentos e sustento espiritual.
Os valores são importantes nas comunidades indígenas, onde as pessoas mais respeitadas não são aquelas que acumularam riqueza material ou alcançaram grande sucesso pessoal. O maior respeito é reservado àqueles que ajudam outras pessoas, àqueles que compreendem que suas vidas se desenrolam em meio a um conjunto de relações recíprocas.
A maneira pela qual os povos tribais se governam também difere de região para região. Nos Estados Unidos há mais de 560 governos tribais com relação direta com o governo federal. Esses governos exercem uma série de direitos soberanos, inclusive administrando seus próprios sistemas judiciais e suas forças policiais, operando escolas e hospitais e dirigindo um amplo leque de empreendimentos comerciais. Governos tribais criam dezenas de centenas de empregos e acrescentam milhões de dólares às economias de seus estados. Todos esses avanços beneficiam toda a comunidade, não apenas os membros das tribos. A história, a vida contemporânea e o futuro dos governos tribais nos Estados Unidos estão interligados com os de seus vizinhos.
A base territorial dos governos tribais vai desde alguns que controlam milhões de hectares a outros que possuem menos de 25 hectares de terra. E a população vai de nações navajos e cheroqui, desde aquelas com mais de 250 mil membros registrados a alguns governos tribais com menos de 100 membros. É importante observar que a população ou a base territorial de um governo tribal soberano não determina o grau em que ela usufrui dos direitos de autonomia. Do mesmo modo que o minúsculo principado de Mônaco desfruta de alguns dos mesmos direitos internacionais que a China e os Estados Unidos, os governos tribais com uma minúscula base territorial e população pequena são entidades soberanas com os mesmos poderes das tribos com grande população ou base territorial.
À medida que avançam no século 21, os indígenas enfrentam muitos desafios cruciais nas áreas política, social, econômica e cultural. Um dos maiores desafios será desenvolver modelos práticos para captar, manter e transmitir sistemas de conhecimento e valores tradicionais a gerações futuras. Nada pode substituir o sentido de continuidade que a compreensão genuína do conhecimento tribal tradicional oferece. Não há dúvida de que em algumas comunidades indígenas, as línguas, as cerimônias e os sistemas de conhecimento originais perderam-se de maneira irrecuperável, mas em muitas outras a cultura é vibrante, a língua ainda é falada e centenas de cerimônias são realizadas para comemorar mudanças sazonais no mundo natural e na vida dos seres humanos. Todos os anos os indígenas desenvolvem mais projetos para preservar aspectos distintos da sua cultura, como a língua e as plantas medicinais.
Para ver o futuro dos povos indígenas, é necessário olhar para o passado. Se os povos indígenas foram tenazes o suficiente para sobreviver a uma perda enorme de vidas, terras, direitos e recursos, eles parecem bem equipados para sobreviver a quaisquer desafios que estão por vir. Em muitas partes do mundo, os povos indígenas não estão somente sobrevivendo, estão prosperando. Na América do Sul, onde há aproximadamente 40 milhões de índios, líderes indígenas visionários como Evo Morales, presidente da Bolívia, e a ganhadora do Prêmio Nobel Rigoberta Menchú lideram um renascimento cultural e político.
Nas comunidades indígenas há muitas discussões sobre o que significa ser um indígena tradicional nos dias de hoje e o que isso significará no futuro.
Nos Estados Unidos, o futuro parece de certo modo melhor para os povos tribais, devido, em grande parte, à governança autônoma e aos esforços de autodeterminação dos governos tribais. Há muitas histórias inspiradoras de governos tribais e de pessoas reconstruindo e revitalizando suas comunidades e nações.
A Universidade de Harvard recentemente completou mais de uma década de pesquisa abrangente publicada em um livro relativamente esperançoso intitulado The State of Native Nations [O Estado das Nações Indígenas]. A pesquisa indica que a maioria dos indicadores sociais e econômicos está caminhando em direção positiva, muitos governos tribais são sólidos, os níveis de escolaridade estão melhorando e um renascimento cultural está ocorrendo em muitas comunidades tribais.
Nas comunidades indígenas há muitas discussões sobre o que significa ser um indígena tradicional nos dias de hoje e o que isso significará no futuro.
Ser indígena no século 21 significa ser parte de uma comunidade que enfrentou pobreza e opressão devastadoras, mas que encontra muitos momentos de encanto e conforto nas histórias tradicionais, na língua, nas cerimônias e na cultura.
Ser indígena no século 21 significa ser membro de um grupo detentor de algum dos mais valiosos e antigos conhecimentos sobre o planeta, um povo que ainda tem uma relação direta com a terra e um senso de responsabilidade para com ela.
Ser indígena no século 21 significa confiar em seu próprio pensamento novamente e não somente articular sua própria visão de futuro como também ter, dentro das comunidades, um conjunto de habilidades e capacidade de liderança para transformar essa visão em realidade.
Ser indígena significa, a despeito de tudo, ainda ser capaz de sonhar com um futuro no qual as pessoas em todo o mundo apoiarão os direitos humanos e a autodeterminação dos povos indígenas. Terra e recursos podem ser colonizados, mas nunca os sonhos.
Ser indígena no século 21 significa manter redes de relacionamento e compartilhar conhecimentos tradicionais e melhores práticas com as comunidades indígenas em todo o planeta usando o iphone, aparelhos celulares Blackberry, os sites Facebook, Myspace, Youtube e qualquer outra ferramenta tecnológica disponível.
Ser indígena no século 21 significa ser empreendedor, médico, cientista ou até mesmo um astronauta que deixará suas pegadas na lua e então retornará ao lar para participar das cerimônias que seu povo vem realizando desde o início dos tempos.
Ser indígena no século 21 significa honrar nossos ancestrais que mantiveram a visão firmemente fixa no futuro, independentemente do que estava acontecendo no presente.
Ser indígena no século 21 significa reconhecer as injustiças passadas, mas nunca ficar paralisados ou sem ação por raiva do passado ou de todos os desafios atuais.
Significa seguir o conselho de nossos pais, avós e tataravós, os que nos lembram que é difícil ver o futuro com lágrimas nos olhos.


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